Os ídolos do esporte cada vez mais têm
suas imagens esculpidas para serem vendidos como bons moços, pessoas
humildes, que gostam de crianças e animais. São na verdade transformados
em uma substância insípida, inodora e incolor. Afinal de contas, ser um
produto bom pra vender é a função de uma mercadoria no sistema
capitalista, e não manifestar opiniões e, principalmente, convicções. O
ex-jogador Sócrates, que morreu no último domingo, 4 de dezembro, foi o
oposto disso, foi autêntico e inteligente, foi ousado, foi
revolucionário.
A classe trabalhadora teve muitos amigos
ilustres, pessoas que ganharam fama por habilidades esportivas,
artísticas, etc. E que aproveitaram a visibilidade gerada por suas
funções para se posicionar publicamente contra a ideologia dominante e a
classe dominante, estando ao lado dos trabalhadores em batalhas
concretas.
O doutor Sócrates foi um desses. Dizia-se socialista, defensor da revolução. A origem humilde no Pará lhe mostrou que o mundo não é justo, mas descobriu que com a luta o mundo pode sim ser mais justo e democrático.
Militante petista, Sócrates participou ativamente da campanha pelas “Diretas Já!”
para presidente da república na década de 80 e teve uma participação
fundamental no movimento Democracia Corinthiana, junto a outros
jogadores como Wladimir e Casagrande e o diretor Adilson Monteiro Alves,
que pôs em prática um maior poder de decisão para o coletivo no clube
de futebol, realizando votações para decidir questões como escalação,
regras na concentração, os locais da concentração, as contratações e até
os prêmios e pagamentos da equipe, entre outras coisas. Todos tinham
direito a voto e não havia distinção ou peso maior, fosse titular,
reserva ou equipe de apoio (dos diretores aos roupeiros, todos votavam
com peso igual nas decisões).
Dentro do contexto de Ditadura Militar
que vivia o país, um movimento como esse era uma clara afronta ao regime
político vigente. Basta lembrar que a primeira eleição direta para
governador em São Paulo
ocorreu no ano de 1982, apenas um ano depois do início da Democracia
Corinthiana. A experiência foi tão bem sucedida que, além do título de
bi campeão paulista, o Corinthians saudou sua dívida herdada da gestão
anterior e ainda deixou o caixa com saldo positivo. Isso sem sequer
precisar vender espaço de propaganda nos uniformes, que eram
substituídos por palavras de ordem políticas como “Diretas Já” e “Eu
quero Votar pra Presidente”. Nessa época que se deu a presença de
Sócrate em palanques e atos públicos pelas eleições, contando com seus
companheiros de clube, comprovando a situação peculiar que vivia o time
naquela época, a politização geral da sociedade e o estado de
consciência política do grupo, já que a organização e principalmente as
ações modificadoras das relações sociais nunca são obra de um único indivíduo, por mais genial que ele possa parecer, mas fruto de uma ação coletiva.
No seu palco, os gramados, após os gols
Sócrates comemorava com um braço erguido e o punho cerrado, um gesto que
nos remete a uma saudação comunista e que nos traz à memória outro
momento de protesto no esporte, quando dois atletas americanos, Tommie
Smith e John Carlos,
nas olimpíadas do México em 1968, subiram ao pódio pra receber suas
medalhas e estenderam um braço com o punho fechado e uma luva negra, a
saudação dos Panteras Negras. Como eles, outros atletas, como o jogador
brasileiro Reinaldo, do Atlético de MG, e o português Eusébio, também
conhecido como “Pantera Negra”, adotaram a comemoração dos seus gols com
punho fechado, utilizando um momento festivo e lúdico do esporte para
uma expressão política, de solidariedade aos trabalhadores e oprimidos
do mundo.
Sócrates declarava-se abertamente um
defensor da Revolução Cubana e da Revolução Venezuelana. Inclusive deu a
seu filho caçula o nome Fidel, dizia ele que foi o único nome de filho
que escolheu.
Não poderíamos deixar de lembrar a sua
genialidade com a bola. Inteligente também no seu ofício nos gramados.
Era um jogador elegante, com passes eficientes, ficando famoso por seus
toques de calcanhar. Sua capacidade de liderança somada ao desempenho
como jogador levou-o a condição de capitão da seleção que disputou a
Copa de 1982, time comandado pelo grande Telê Santana que encantou o
mundo pelo seu futebol arte, mesmo não ganhando o título do campeonato.
Nós trazemos essa homenagem a Sócrates,
uma figura única que deixa lições e saudades. Homenagem a Sócrates que é
também uma homenagem e reconhecimento à experiência prática que foi a
Democracia Corinthiana e sua significação histórica, para além do
futebol.
Recomendamos, pra finalizar, esse documentário que acaba de ser lançado em 9/12/2011, chamado Ser Campeão é Detalhe, que conta a experiência da Democracia Corinthiana:
Recomendamos, pra finalizar, esse documentário que acaba de ser lançado em 9/12/2011, chamado Ser Campeão é Detalhe, que conta a experiência da Democracia Corinthiana:
Por Mario Conte e Alex Minoru
Fonte: Esquerda Marxista
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