Izabela
Vinagre Pires Franco, filha de Vic e Valéria Pires Franco, passou em Medicina
numa faculdade particular em São Paulo, chamada Anhembi Morumbi, mais conhecida
pelos cursos de Moda e Gastronomia, e segundo o site do MEC sem
conceito no Enade e sem conceito no CPC (Exame Nacional de
Desempenho dos Estudantes e Conceito Preliminar de Curso) - indicadores de qualidade de um
curso ou instituição – e, sem fazer sequer uma prova, tentou,
administrativamente, se matricular na UEPA.
A UEPA denegou o pleito em todas as instâncias. Então, ela impetrou Mandado de Segurança e obteve
liminar, exarada pelo juiz Marco Antonio Lobo Castelo Branco, titular da 2ª Vara
da Fazenda de Belém, em evidente afronta à Constituição, à lei, à doutrina e à
jurisprudência, inclusive ao próprio STF, que já se pronunciou sobre a questão,
no sentido de que só pode ser
feita de instituição privada para privada, e de pública para pública. A
transferência de universidade privada para pública é ilegal e imoral,
notadamente na forma pleiteada.
Como se observa no despacho, o próprio magistrado
reconhece a ilegalidade do ato em sua decisão, que justifica pela alegada "depressão" de que a jovem socialite
estaria sofrendo. Ora, todas as boates e bares de Belém são assiduamente frequentadas
por Izabela, sempre badalando alegremente, em meio a incontáveis testemunhas, e
ontem mesmo eu a vi na Grand Cru, acompanhada do namorado, bebendo vinho,
vendendo saúde e felicidade, expressa pelas constantes risadas. Lá já estava
quando cheguei e permaneceu depois que saí, mais um sinal de que a noite estava
pra lá de boa.
É de se perguntar: Izabela foi submetida a uma junta médica do SUS, que
confirmasse sua “depressão”? Os autos revelam que não. Ela simplesmente foi
alegada e de pronto aceita.
Cabe perguntar também: e os milhares de estudantes que se candidataram a
uma vaga no curso de Medicina da UEPA, prestaram Vestibular, e não foram
considerados aptos pela nota alcançada? Izabela nem se deu ao trabalho de se
inscrever. Não quer fazer vestibular. É mais igual perante a lei do que os
outros, a maioria filhos de famílias pobres, que sonham com o curso superior e
não conseguem se classificar por culpa da péssima qualidade do ensino público?!
A liminar violou decisão do STF na ADIN no 3324-7, que tem efeito
vinculante para todo o Judiciário e para a administração pública. Pisou nos
princípios constitucionais da Autonomia Universitária (art. 207), da Isonomia e
da Proporcionalidade – Igualdade de acesso aos víveis mais elevados de ensino (art. 5º, caput e I; art. 37; art. 206, I a VII; art. 208, V, todos da Constituição
da República). Rasgou o art. 49 da Lei
nº 9.394/996, que estabeleceu as diretrizes e bases da educação nacional, que
garante: “As instituições de educação superior aceitarão a transferência de
alunos regulares, para cursos afins, na hipótese de existência de vagas, e
mediante processo seletivo.”
Na ADI
3.324/DF, o acórdão não deixa dúvidas a interpretações:
“Vistos,
relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal
Federal, em sessão plenária, na conformidade da ata do julgamento e das notas
taquigráficas, por unanimidade, em
julgar procedente, em parte, a ação para, sem redução do texto do artigo 1º da
Lei nº 9.536, de 11 de dezembro de 1997, assentar
a inconstitucionalidade no que se lhe empreste o alcance de permitir a mudança, nele
disciplinada, de instituição particular para pública, encerrando a cláusula
“entre instituições vinculadas a
qualquer sistema de ensino” a observância da natureza privada ou pública daquela de origem,
viabilizada a matrícula na congênere. Em
síntese, dar-se-á a matrícula, segundo o artigo 1º da Lei nº 9.536/97, em
instituição privada se assim o for a de origem e em pública se o servidor
ou o dependente for egresso de instituição
pública, tudo nos termos do voto do relator. Brasília, 16 de dezembro de
2004. Nelson Jobim – Presidente.Marco Aurélio – Relator.” (grifos meus)
Em seu voto, lecionou o ministro Marco
Aurélio:
“Busca-se demonstrar que o tratamento
diferenciado encerra exceção e que há de estar assentado em relação de causa e efeito
bem como na proporcionalidade entre o meio utilizado para a tutela de bem
individual ou de grupo e os efeitos da medida, considerada a coisa pública. Ter-se-ia o menosprezo aos citados princípios.
Daí sustentar-se a violência ao
princípio da igualdade de acesso ao ensino, previsto no artigo 206, inciso
I, da Constituição Federal, e ao
princípio republicano – a coisa pública pertence a todos –, a desaguar no
ingresso mediante o critério meritocrático de seleção, via o vestibular, tal
como previsto no inciso V do artigo 206 da Constituição Federal, prevalecendo os princípios da
impessoalidade e da moralidade, consagrados no artigo 37 do citado diploma.”
(...) “Faltaria
correlação lógica entre meio e fim, ficando
configurada a transgressão do artigo 5º, cabeça e inciso I, e 206, inciso I, da
Constituição Federal, implicando o artigo 1º da Lei nº 9.536/97 desrespeito ao
princípio da proporcionalidade, com privilégio para determinado grupo social.
Absorvidas as vagas existentes, restaria
afastada a possibilidade de ingresso do conjunto social, em benefício de alguns
poucos. Então, diz-se obstaculizado o acesso da sociedade à educação.”
(...)“A matrícula
logicamente sempre será pretendida na instituição pública, levando em conta não
só a envergadura do ensino, como a própria gratuidade, absorvendo-se vagas que
devem e precisam, de acordo com a Constituição Federal, ser oferecidas,
presente o mérito dos candidatos, a toda
a sociedade, viabilizando-se a participação igualitária em disputa que hoje é
acirrada, ante a situação precária do ensino público, notada a flagrante
escassez de vagas oferecidas.”
(...) “Não pode se mostrar verdadeiro mecanismo
para lograr-se a transposição da seara particular para a pública, sob pena de
se colocar em plano secundário a isonomia – artigo 5º, cabeça e inciso I -, a impessoalidade, a moralidade na Administração Pública, a
igualdade de condições para o acesso e permanência na escola superior, prevista
no inciso I do artigo 206, bem como a viabilidade de chegar-se a níveis mais
elevados do ensino, no que o inciso V do artigo 208 vincula o fenômeno à
capacidade de cada qual.”
(...) “Em síntese, dar-se-á a matrícula, segundo o
artigo 1º da Lei nº 9.536/97, em instituição privada, se assim o for a de
origem, e em pública, caso o servidor ou dependente for egresso de instituição
pública.”
O ministro Joaquim Barbosa assim se
manifestou:
“Parto
da premissa de que a educação, além de ser um direito fundamental de cunho
social, constitui um bem ou prestação que se reveste, entre nós, da
característica da escassez. Cumpre ao Estado, em princípio, oferecê-la,
indistintamente, a todos, em igualdade de condições.
(...) O certo é que, para que se legitimem, medidas de caráter
manifestamente derrogatório de um sistema de acesso, tais como a prevista na
norma impugnada, devem passar por testes rigorosos de constitucionalidade,
tendentes a verificar, de um lado, se a norma que confere a respectiva vantagem
tem como escopo o atingimento de um objetivo constitucional legítimo e, de
outro, se o meio utilizado serve, efetivamente, à obtenção dos fins almejados. Este
é, em suma, o chamado strict scrutiny, que norteia, por exemplo, toda a prática
de jurisdição constitucional da Corte Suprema dos Estados Unidos em matéria de
igualdade, especialmente no campo da educação.
(...) Ao teste da proporcionalidade, seja porque só mediatamente nela se
vislumbra a busca de um objetivo constitucionalmente legítimo, seja porque o atendimento ao grupo
beneficiário da norma pode se efetuar de forma bem menos gravosa e restritiva
de direitos de outros, seja ainda porque os benefícios que supostamente seriam obtidos
com a implementação dessa norma não são susceptíveis de compensar os
sacrifícios que ela engendra.
Com essas considerações, acompanho o eminente ministro relator.” ( grifos meus)
Confiemos no senso de justiça do
juiz
Marco
Antonio Lobo Castelo Branco, de que, percebendo que incorreu em grave
equívoco, reveja sua decisão liminar, tornando-a nula de pleno direito,
em obediência a
todo o ordenamento legal e constitucional brasileiro, e ao sentimento de
aplicação da Justiça que deve nortear o Judiciário.
Fonte: Blog
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